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Armas Históricas

Trabuco nas operações de cerco

Enquanto a pólvora não marcava presença na guerra, o terror voava pela física do poderoso trabuco, que lançava de rochas a cadáveres e emissários de paz.


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Escrito por Eudes Bezerra
Leitura: 4 minutos
três trabucos em exposição
Um dos pátios do Château de Castelnaud, na França, em que três trebuchetes são exposto permanentemente. O Castelo de Castelnaud é uma construção medieval do século XIII e atualmente é um dos maiores museus de guerra medieval do planeta. É tombado como Patrimônio Histórico da França. Créditos: autoria desconhecida.

Enquanto a pólvora não marcava presença na guerra, o terror voava pela física do gigantesco trabuco. Descendente milenar de instrumentos como a catapulta, o engenho se mostrou decisivo em operações de cerco e não apenas com arremessos de rochas e vasos incendiários, mas também de prisioneiros e cadáveres infectados por doenças. Não raramente, tornavam-se as queridinhas dos comandantes, como Ricardo Coração de Leão, que, carinhosa e ironicamente, apelidou duas de Mal Vizinho e Catapulta de Deus.

Descendente de uma longa e devastadora linha de artilharia mecânica, como onagros, mangoneis e balistas, o trabuco, ou trebuchet, é costumeira e erroneamente chamado de catapulta. O seu desenvolvimento uniu cientistas e comandantes militares e, como ainda hoje acontece, o criadores dos engenhos já percebiam boa remuneração, incentivos a pesquisas e gozavam de mordomias, também sendo às vezes vítimas do seu empregador, sobretudo déspotas enraivecidos. O gênio Leonardo da Vinci foi um dos que criaram tais armas infernais para a defesa.

O trabuco, quando empregado contra fortalezas, castelos e alvos similares, causava efeitos devastadores, sendo muitas vezes foi a chave da vitória. Por isso, costumava receber os apelidos de a rainha ou a mãe das batalhas medievais de sítio. A difusão do invento sobre a Europa, provavelmente, ficou a cargo das hordas mongóis de Gêngis Khan que eram mestres em ações de sítio e importaram a tecnologia dos árabes, talvez chineses.

O engenho lograva êxito após sucessivos arremessos precisos em locais definidos, onde, de acordo com cada lançamento, a resistência do alvo (muralha, torre, muro e afins) era reduzida até sua completa destruição. Assim, deflorava-se os muros que dividiam sitiadores e sitiados, levando-os ao confronto direto. Inobstante, a alimentação das armas era bem variável: rochas, vasos de argila (recheados com munição incendiária), prisioneiros, emissários de paz e cadáveres de animais, como bois e cavalos.

Embora fosse de complexa instalação (podia durar meses, dependendo do tamanho do trabuco e da disponibilidade de trabalhadores), a execução do movimento era relativamente simples: seu braço se deslocava no eixo vertical liberando o projétil no ponto mais alto para obter alcance máximo. O número de membros da equipe a executar a função de tiro também variava de acordo com a força mecânica.

“Alcançando 20 metros de altura [seis andares], um grande trebuchet podia arremessar pedras a 250 metros ou mais. Reconstruções recentes demonstraram seu temível poder: no castelo de Castelnaud, na França, uma máquina experimental conseguiu lançar uma bola de 136 quilos a cerca de 220 metros com extraordinária precisão. Um modelo similar construído na Escócia mostrou-se capaz de fazer repetidos disparos através de uma abertura tão pequena quanto uma janela de tamanho normal”. (NEWARK, 2011, p. 114, acréscimo nosso)

trabuco gigantesco
Imenso trabuco. Créditos: autoria desconhecida.

TRÊS OPERAÇÕES DE CERCO HISTÓRICAS USANDO TRABUCO:

Operação 1: Ricardo I (Coração de Leão) arremessa vasos incendiários

Em 1191, durante a Terceira Cruzada, Ricardo I, da Inglaterra, recém-desembarcado na Terra Santa, juntou-se a Felipe II da França, para intensificar as operações de cerco à cidade de Acre (atual Akko, em Israel), que já duravam dois anos. Utilizando seus dois xodós (tremendos trabucos) apelidados de Catapulta de Deus e Mal Vizinho (ou Vizinho do Mal), Ricardo Coração de leão derrotou os defensores muçulmanos e conquistou a cidade em seis semanas.

Operação 2: Os Mongóis fazem a guerra biológica

Em 1346, os mongóis, no sítio ao porto genovês de Caffa, lançaram seus próprios mortos a partir de trebuchets. Os soldados haviam morrido de uma doença misteriosa e, supostamente, tenha sido a Peste Negra. Ao final do cerco, muitos genoveses voltaram para casa transmitindo a doença que mataria um terço da população europeia. [o episódio ocorrido em Caffa é um dos apontados como possível iniciador da Peste Bubônica]

Operação 3: Eduardo I da Inglaterra arremessa rochas

Em 1304, Eduardo I da Inglaterra fez uso dessa tecnologia para o sítio do castelo escocês de Stirling. A construção do engenho (feita por cinco mestres carpinteiros e engenheiros com cinquenta auxiliares) exigiu três meses de trabalho e o resultado do cerco veio após o primeiro lançamento executado, quando o incrível poder de fogo do Lobo de Guerra — apelido dado por Eduardo I — foi evidenciado, o que rapidamente arrancou a rendição da guarnição do castelo.

REFERÊNCIAS:
JESTICE, Phyllis G. História das Guerras e Batalhas Medievais. O Desenvolvimento de Técnicas, Armas, Exército e Invenções de Guerra na Idade Média. trad. Milton Mira de Assumpção Filho. São Paulo: M. Books, 2012.
NEWARK, Tim. História Ilustrada da Guerra. trad. Carlos Matos. São Paulo: Publifolha, 2011.
ONÇA, Fabiano. Catapulta – A mãe de todas as guerras. Acesso em: 7 abr. 2015.
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Eudes Bezerra

35 anos, pernambucano arretado, bacharel em Direito e graduando em História. Diligencia pesquisas especialmente sobre História Militar, Crime Organizado e Sistema Penitenciário. Gosta de ler, escrever, planejar e principalmente executar o que planeja. Na Internet, atua de despachante a patrão, enfatizando a criação de conteúdo.

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