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Brasil

Voto de Cabresto: O que foi, combate e dias atuais

Voto de Cabresto: Coronéis, Guarda Nacional, Curral Eleitoral, Getúlio Vargas, Código Eleitoral, tudo que você precisa saber!


charge sobre o voto de cabresto no brasil
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Escrito por Eudes Bezerra
Leitura: 8 minutos
charge sobre o voto de cabresto no brasil
Voto de Cabresto: Coronéis, Guarda Nacional, Curral Eleitoral, Getúlio Vargas, Código Eleitoral, Justiça Eleitoral, tudo que você precisa saber! Créditos: Charge de Arionauro Cartuns / Montagem: Eudes Bezerra.

O voto de cabresto marcou a história do Brasil, sendo caracterizado pelo controle e manipulação das eleições através de ameaças e clientelismo por parte dos coronéis e políticos.

TÓPICOS SOBRE O VOTO DE CABRESTO

1. Voto de Cabresto: Resumo
2. Origens e contexto histórico do Voto de Cabresto
3. Consolidação do Voto de Cabresto na República Velha
4. Combate e superação do Voto de Cabresto
5. Legado do Voto de Cabresto nos dias atuais
6. Desafios para a democracia brasileira
Conclusão
Referências

1. VOTO DE CABRESTO: RESUMO

O que foi o Voto de Cabresto?

O voto de cabresto nada mais era do que uma ação política que marcou a história do Brasil (império e república), caracterizado pela manipulação e pelo controle do voto dos eleitores por parte de políticos ou líderes locais (coronéis).

Ao longo dos séculos, o país sofreu duramente em relação à democracia e à própria participação política ativa de sua população por ter sido uma colônia de exploração, mas, quando isso mudou, as artimanhas das elites também mudaram.

Quando houve a possibilidade de votação, visto que por muito tempo após a independência, grande parte da população brasileira era analfabeta e pobre, sendo excluída de votar e ser votada, criou-se um modo bastante difundido de garantir o resultado nas urnas: o voto de cabresto.

O voto de cabresto gerava o chamado curral eleitoral no qual todo e qualquer eleitor mais humilde era forçado — com grave ameaça ou venda de voto — a votar nas indicações dos chamados coronéis.

Os coronéis, costumeiramente, eram grandes membros da aristocracia agrícola que, após a fundação da Guarda Nacional em 1831, agiram com ameaça armada na condução do processo eleitoral no Brasil, principalmente na República Velha (1889-1930) e anos seguintes nas regiões mais remotas.

Ainda hoje, diversas regiões do país, sobretudo as mais pobres ou distantes dos centros políticos, sofrem com esse tipo de coerção, ainda que não mais na abrangência ocorrida durante o império e a República Velha.

Importante desde já ressaltar o atual poder das milícias nos grandes centros políticos, como na cidade fluminense do Rio de Janeiro, e o chamado voto de cajado, no qual líderes religiosos coagem fiéis a votar em determinados candidatos.

Por fim, com a chegada de Getúlio Vargas ao poder em 1930 e a criação do Código Eleitoral Brasil e da Justiça Eleitoral em 1932, a Guarda Nacional, já extinta (1922), deixou como resquício os temidos coronéis.

Os coronéis, embora tivessem perdido bastante força e apoio político na em medida que Getúlio Vargas ampliava as suas ações, continuaram agindo em interesse próprio na sua região quando ocorria a ausência do Estado Democrático de Direito.

foto oficial de getúlio vargas como presidente do brasil
Getúlio Vargas após a Revolução de 1930, quando deu um golpe de estado e pôs fim à República do Café com Leite. Créditos: autoria desconhecida / Colorida por Djalma Gomes Netto / Galeria dos Presidentes, Planalto, Brasília.
voto de cabresto na atualidade com as milícias e líderes religiosos (voto de cajado)
O estado do Rio de Janeiro, sobretudo nas regiões mais carentes e desassistidas, sofre com o poder do crime organizado pré-mafioso e das milícias. Estas, resumidamente, tratam-se de uma mistura bandida de policiais e políticos com o tradicional crime organizado brasileiro. Créditos: Tropa de Elite 2: O Inimigo Agora é Outro (BR, Padilha, 2010). 

2. ORIGENS E CONTEXTO HISTÓRICO DO VOTO DE CABRESTO

O voto de cabresto teve sua origem no período imperial brasileiro a partir do projeto de lei peticionado pelo então ministro da Justiça da Regência, o padre Diogo Antônio Feijó.

Nessa época, foi criada a Guarda Nacional, uma espécie de força paramilitar para atuar localmente, visto a pequena dimensão do Exército Brasileiro à época.

Diferentemente do exército que ficou em segundo plano, a Guarda Nacional era lideradas por inúmeros coronéis por todo o território do Império do Brasil.

De inspiração francesa, a ideia era que todo “cidadão” portasse armas para defender o Brasil.

No entanto, esta ideia de cidadania era restrita aos grupos aristocráticos e na prática se tornou uma forma de controlar o sistema eleitoral no Brasil.

Assim, o sistema político era marcado pelo Coronelismo, uma estrutura bem rígida de poder na qual os coronéis detinham grande influência nas regiões, principalmente as rurais e afastadas das maiores cidades.

Por fim, com a criação da Guarda Nacional e os seus líderes, os coronéis, ocorreu o controle dos trabalhadores rurais, obrigando-os a votar, quando se tornou possível votar, em candidatos escolhidos por eles sob a ameaça de punição ou retaliação.

Por vezes, também havia a compra de votos (Clientelismo) em uma forma mais amena de garantir o resultado nas eleições, embora a ameaça, até mesmo a de morte, rodeasse o eleitor…

charge declarando a facilidade de fraudar a eleição durante o voto de cabresto
O voto era extremamente simples de se averiguar ou mesmo de se fraudar as “urnas” uma vez que não era secreto, sendo estas muitas vezes meras caixas ou mesmo sacos — e que os coronéis possuíam acesso. Créditos: autoria desconhecida. 

3. CONSOLIDAÇÃO DO VOTO DE CABRESTO NA REPÚBLICA VELHA

O voto de cabresto teve o seu auge durante a República Velha (1889-1930).

Nesse período, ficou conhecida a Política dos Governadores, na qual os governadores estaduais tinham amplo controle sobre a política de sua região, valendo-se dos coronéis para garantir o resultado nas urnas.

Além das já referidas práticas usuais, como as de cunho clientelista e as coercitivas, ocorria uma contrapartida — dinheiro e “favores” políticos — do governo central para os governadores estaduais e posteriormente aos coronéis.

Em teoria, essa contrapartida deveria ser aplicada na região de atuação dos governadores estaduais, mas o erário (dinheiro público) sofria inúmeros desvios e saques criminosos por parte dos próprios políticos e coronéis.

Os coronéis, por sua vez, detinham o poder econômico e político nas áreas rurais, controlavam os eleitores por meio de favores, promessas de emprego, terras e recursos.

Em troca, os coronéis recebiam a sua parte dos seus respectivos governadores estaduais em uma espécie de efeito cascata que vinha das elites políticas que dominavam a República Velha (Café com Leite).

charge sobre o voto de cabresto com clientelismo no brasil
Charge que demonstra simplificadamente como ocorria o Voto de Cabresto em período de eleição, de acordo com o Clientelismo. Créditos: Arionauro Cartuns.
charge mostrando coronel coagindo eleitores a votar em si mesmo
Por vezes, as próprias “cédulas” de votação eram feitas pelos coronéis, visto que grande parte da população era analfabeta (e até defunto votava!). Créditos: Arionauro Cartuns. 

4. COMBATE E SUPERAÇÃO DO VOTO DE CABRESTO

O voto de cabresto foi combatido ao longo do século XX — e ainda é! — por movimentos políticos e sociais que lutavam/lutam por maior participação e representatividade popular.

Com o advento da Justiça Eleitoral e do Código Eleitoral em 1932, diversas medidas foram criadas e aperfeiçoadas para combater as práticas corriqueiras de fraude e coerção nas eleições.

O voto secreto, a identificação civil dos candidatos e a criação de zonas eleitorais foram avanços importantes para garantir maior liberdade de voto.

os primeiros funcionários do tribunal regional eleitoral do paraná
Os primeiros funcionários do Tribunal Regional Eleitoral do Paraná no ano de 1933. Créditos: autoria desconhecida / Acervo Arquivo Nacional. 

5. LEGADO DO VOTO DE CABRESTO NOS DIAS ATUAIS

Embora o voto de cabresto tenha sido superado em grande medida, ainda é possível encontrar vestígios dele na atual política brasileira.

A influência econômica, o poder de barganha e a ameaça violenta continuam a desempenhar um papel significativo nas eleições tanto em zonas rurais quanto urbanas.

A compra de votos, o clientelismo e principalmente a troca de favores políticos (algo mais discreto, sutil) ainda persistem, comprometendo e corroendo a verdadeira representação da vontade popular.

charge sobre o voto de cabresto mostrando político conduzindo eleitor
Charge irônica de 1927, da revista Careta, ilustrando o voto de cabresto: o eleitor sendo conduzido por um político para que votasse no(s) seu(s) candidato(s). Créditos: autoria desconhecida / Biblioteca Nacional Digital. 

6. DESAFIOS PARA A DEMOCRACIA BRASILEIRA

O voto de cabresto, mesmo em sua forma mais branda, ainda representa um grande desafio para a democracia brasileira que sofre, eventualmente, com ataques ao sistema eleitoral.

A falta de educação política, a desigualdade socioeconômica, a ausência de um sistema político-partidário mais robusto e as próprias divergências e preconceitos regionais perpetuam o uso de práticas ofensivas às eleições democráticas.

Além disso, a corrupção sistêmica e a gritante sensação de impunidade por parte dos agentes públicos brasileiros, dificultam ainda mais a construção de um ambiente político-eleitoral transparente, igualitário e funcional.

o presidente juscelino kubitschek votando nas eleições de 1958
O presidente Juscelino Kubitschek votando nas eleições de 1958. Créditos: autoria desconhecida / Acervo Tribunal Superior Eleitoral. 

CONCLUSÃO

O voto de cabresto foi — e continua sendo, mas em uma frequência menor e adaptada — uma prática enraizada na história política do Brasil, marcando períodos de controle e manipulação eleitoral há quase dois séculos.

Embora o país tenha avançado na promoção da democracia e no combate a essas práticas, ainda há desafios a serem superados.

A conscientização cívica, o fortalecimento das instituições democráticas e a participação ativa da sociedade civil são peças fundamentais para garantir a livre expressão da vontade popular e a consolidação da democracia no Brasil.

a primeira sede do tribunal superior eleitoral no rio de janeiro em 1930
A primeira sede do Tribunal Superior Eleitoral, no Rio de Janeiro, década de 1930. Créditos: autoria desconhecida / Acervo Tribunal Superior Eleitoral.

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Fonte: Incrível História: https://incrivelhistoria.com.br/ (ou o link do endereço desta página).

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REFERÊNCIAS PRINCIPAIS:

AMORIM, Carlos Roberto. CV – PCC: a irmandade do crime. 7. ed. Rio de Janeiro: Record, 2006.

AMORIM, Carlos Roberto. Assalto ao Poder. Rio de Janeiro: Record, 2010.

AMORIM, Carlos Roberto. Comando vermelho: a história do crime organizado. Rio de Janeiro: BestBolso, 2011.

BRAICK, Patrícia Ramos; MOTA, Myriam Becho. História: das cavernas ao terceiro milênio. 3ª ed. reform. e atual. São Paulo: Moderna, 2007.

DOLHNIKOFF, Miriam. História do Brasil Império. 1. ed., 3ª reim. São Paulo: Contexto, 2020.

FAUSTO, Boris; FAUSTO, Sérgio (colab). História do Brasil. 14ª ed. atual. e ampl., 2º reimpr. São Paulo: Editora da Universidade de São Paulo, 2015.

SCHWARCZ, Lilia Moritz; STARLING, Heloisa Murgel. Brasil: uma biografia. 1ª ed. São Paulo: Companhia das Letras, 2015.

WESTIN, Ricardo. Criada há 90 anos, Justiça Eleitoral pôs fim a tradição de fraude nas votações do Brasil, in Agência Senado Federal. Acesso em: 03 jul., 2023.

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PALAVRAS-CHAVE SECUNDÁRIAS:
Brasil Império, Brasil República, Período Regencial, Guarda Nacional, Coronelismo, curral eleitoral, clientelismo, voto de cabresto, Código Eleitoral, Justiça Eleitoral, Getúlio Vargas, o que foi o voto de cabresto brainly.

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Eudes Bezerra

35 anos, pernambucano arretado, bacharel em Direito e graduando em História. Diligencia pesquisas especialmente sobre História Militar, Crime Organizado e Sistema Penitenciário. Gosta de ler, escrever, planejar e principalmente executar o que planeja. Na Internet, atua de despachante a patrão, enfatizando a criação de conteúdo.

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